O som era de uma manhã comum em um lugar tranquilo. O quarto estava escuro e a cortina entreaberta deixava apenas um feixe de luz invadir o local e refletir a bela garota que dormia emaranhada entre lençóis e cabelos. Só isso.
Estava sozinha em uma cama para dois.
Ela se remexe como querendo encontrar posição melhor para continuar o sono. Não consegue. O raio de sol bate direto em seus olhos de 'garfield' fazendo-a piscar repetidas vezes até conformar-se: não vai mais dormir.
Senta-se na cama. Encosta na cabeceira. Está enjoada. Lembra-se já estava enjoada. Não reconhece a cama nem o quarto. Se desespera. Sai da cama, mas, a tontura e as náuseas não a deixam. Desesperada ela tenta lembrar da noite anterior.
Começam a lhe vir alguns 'flashs'. Pessoas dançando funk em uma festa. Ela nao consegue identificar quem seja. Risadas, muitas risadas.
Ainda sentada na cama tem um impulso de gorfo. Se levanta abruptamente. Com a mão na boca procura por um banheiro e o encontra na porta à sua frente. Entra e vomita. Percebe o banheiro 'nojento' porém muito requintado. Vê alguns pacotes de camisinha em cima do mármore da pia quando se levanta para lavar o rosto. Ainda não consegue reconhecer onde está.
Molha o rosto na pia e ao se ver no espelho lembra de mais um flash. Uma sala, a mesma onde estavam dançando, momentos antes , quando suas amigas estavam fazendo-a adivinhar presentes. Ela erra. Entra pela sala um go-go dancer que a seduz. Eles dançam juntos. Ela relembra o flash anterior e identifica suas amigas dançando em uma pista de dança improvisada em uma grande sala.
Ela é da alta sociedade de uma cidade provinciana. Suas amigas idem. Era inimaginável o jeito que dançavam o funk carioca sem pudores. Somente mulheres e o go-go dancer que se ocupava única e exclusivamente dela.
Volta para o quarto. Vê uma piscina do tipo 'Jacuzzi' do lado de fora, na varanda. Pensa: 'eu não posso ter feito isso!'.O ambiente, de um todo, bem poderia ser um motel. Tem novo flash da festa, quando bebeu caipirinhas seguidas e ficou completamente tonta. Se jogou em cima do go-go dancer que não parava de dançar. Lembra-se de ter tido a sensação de que iria desmaiar, com sua vista escurecendo e suas duas grandes amigas correndo preocupadas em sua direção. Não se lembra de mais nada.
Derrepente um silêncio.
Ronco de homem vindo da ante-sala do quarto. Ela não se conforma com o que fez, mas, ao mesmo tempo, não tem certeza, embora as evidências sejam muitas. Com medo, caminha em direção à ante-sala quando entra pela porta do quarto uma de suas grandes amigas:
- Tá tudo bem?
- Ai que bom que você está aqui! - diz ela desesperada e correndo em direção à amiga. - Por favor, me tira daqui rápido. Não sei como fiz isso! Eu vou me casar! Se ele descobre fudeu!
A amiga olha para ela sem entender o que acontece.
- Ei, ei, calma. Peraí, tá tudo certo!
- Como é que você veio parar aqui? Como é que você entrou?
- Calma. - diz a amiga segurando-a pelo braço para contê-la. Ela está desesperada. - Não se desespera! Tá tudo certo. A gente tá na casa da ilha!
- Na casa da ilha?
- Sim, na casa da ilha. Eu achei melhor ficar por aqui porque você não estava nada bem ontem a noite. Gorfou pacas! Como sempre foi você quem suportou meus porres, agora foi a minha vez.
Ela começa a entender as coisas, embora esteja bastante confusa ainda. Senta-se na cama de volta. Olha a 'Jacuzzi' novamente.
- hahahahahaha! - ri a amiga - Você acordou completamente bêbada e de ressaca ao mesmo tempo, não lembrou de nada, viu essa 'Jacuzzi' ali fora e achou que estava em um motel, certo? hahahaha
Ela faz que sim com a cabeça. A amiga então abre toda a cortina e a porta para entrar um pouco de ar.
- Você nunca tinha visto como ficou a 'Jacuzzi' aqui, né? Lembra que meu pai queria porque queria a tal da 'Jacuzzi'? Aí está. A gente colocou você aqui porque você gorfou meu quarto todinho. Não se lembra? Hahahaha. Que bebedeira! Tá vendo, não tá acostumada dá nisso - diz enquanto ajeita as coisas no quarto.
Ouve-se um ronco. O mesmo ronco de homem que vinha da ante-sala.
- Caralho, ele ronca hein! - diz a amiga para ela.
Ela está morrendo de medo de ver quem está ali.
- Mas que fofo, né? Esse te ama mesmo. Pode casar. Veio te resgatar de você mesma ontem a noite. Sorte que o go-go dancer se ligou e foi embora - diz a amiga em volume mais baixo.
- Você tá dizendo que o cara que está dormindo aí.... - perguta ela desconfiada.
- É o teu noivo gata! Puta cara! Veio aqui depois que te ligou duas vezes e você não atendeu. Também, né, tava bêbada que nem um gambá! Você ainda gorfou em cima dele algumas vezes. Ai ele achou que era melhor dormir no sofá.
Ela se sente aliviada. Entende tudo. Ri de alívio. Vai até a ante-sala. O noivo dorme no sofá todo esprimido. Ela se senta ao lado dele e aproxima bem seu rosto do dele, ainda dormindo. Fica ali observando seu sono e lhe carinhando até que ele acorda e sorri para ela. Ele faz um cafuné nela que lhe beija a mão.
- E aí? Minha Heleninha preferida está melhor? - pergunta ele e ela faz que sim com a cabeça - Deve tá com uma ressaca brava! - completa ele meio sonado se espreguiçando. Ele olha ela mais um pouco e pergunta:
- Que foi?
- Nada.
- Nada? Então porque está me olhando assim? - pergunta ele.
- Olhando como?
- Assim meio...
- Meio orgulhosa? Meio feliz demais? Meio não acreditando que você é verdade?
- É?
- É. Completamente certa do que eu quero.
Fim!